quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Le Mari de la Coiffeuse

O Marido da Cabeleireira (1990), de Patrice Leconte, narra, em primeira pessoa, a história de Antoine: um homem de meia idade que age com a inocência de uma criança e que sonha em casar com uma cabeleira. Ao concretizá-lo passa a viver dentro do salão de sua esposa, sem emprego ou qualquer responsabilidade social, e sem contato com outros indivíduos, apenas os céticos clientes do salão que se tornam peculiares devido à romântica composição do enredo fílmico.

Este jogo entre romantismo e tragédia conduz o espectador rumo à frustração, pois o desenvolvimento da narrativa favorece a expectativa de uma conclusão feliz, mas que, ao final do filme, é rompida pelo breve suicídio da jovem cabeleireira. Deste modo, o filme, através da música e do cenário coerente com as emoções intencionadas pela obra, é construído a fim de efetivar-se como um filme anti-melodramático. Ou seja, não se busca evidenciar sentimentos dramáticos, mas o amor romântico entre a cabeleireira e o inocente Antoine.

O filme, apesar de narrar com clareza a estória, não é linear. São três momentos da vida de Antoine que se intercalam e se confundem: sua infância, seu romance e sua solidão. Para exemplificar a confusão de períodos, no momento em que a cabeleireira aceita casar com ele, mostra-se a ligação daquele momento com sua infância através da imagem da personagem criança no lugar deste já velho. Esta troca de figuras é comum no cinema e grandes nomes como Igmar Bergman, em “Morangos Silvestres”, já oferecera esta experiência.

A massa sonora do filme é composta, em geral, por música e som ambiente. Em alguns momentos, a música se sobrepõe eliminando o som ambiente que retorna através de ruídos ambientais sonoramente harmônicos, como o pisar em cacos de vidro. A música induz, junto às imagens, à efetivação das emoções programadas pela obra. Em alguns casos, não há entre as cenas um limite sonoro. Músicas e falas passam de uma situação a outra agindo, inclusive, como ligação entre cenas.

O cenário auxilia, também, na concretização destes efeitos no apreciador. A infância e o romance com a cabeleireira são ambientados durante o dia, num local antigo e com elementos coloridos, resultando num ambiente lúdico. Já em seu momento de solidão, além da falta de música e sua expressão de tristeza, o cenário é escuro, mostrando, com clareza, apenas seu rosto.

Tanto esta coerência entre os sentimentos e o cenário, nomeada pelo Romantismo de Solene Simpatia, quanto à idéia de um amor que não pode se realizar na terra, pois este é local da imperfeição e do erro são características típicas de obras românticas. No filme, a união destas duas idéias resulta no suicídio de um dos amantes em uma noite chuvosa.

Além de orientar os sentimentos dos personagens, o dia e a noite, assim como, a própria narração em primeira pessoa e a figura da infância e da velhice, contextualizam a duração da estória. Apesar do narrador aparecer após a morte de sua esposa, ele não narra a história. Ao contrário, assiste como nós, mas apenas através dos sons do mise-en-scène, como um fluxo sonoro da memória.

Os planos costumam ser na altura dos olhos dos personagens em cena. Isto causa no apreciador a impressão de estar vendo através dos olhos de outro personagem fora de quadro. Fica claro, porém, que estas não são as câmeras subjetivas, pois, em muitos casos, no filme, o personagem que pensávamos estar vendo através do seu ponto de vista, entra no quadro.

O modo como é construído o filme e as soluções dispostas em busca da efetivação dos efeitos no apreciador fortalecem a desdramatização da obra. A personalidade infantil da personagem principal enaltece a suavização da ação dramática na obra, já que o olhar da criança é comumente associado à felicidade e boas lembranças. É baseado em uma construção romântica e de beleza plástica que a narrativa é conduzida e concluída. Para, a partir deste modo de construção, potencializar ainda mais a frustração do espectador que espera um desfecho análogo ao modo como a narrativa e seus efeitos são estabelecidos no decorrer da apreciação da obra.

2 comentários:

juliana disse...

gostei da resenha, fiquei com ontade de ver.

tá escrevendo direitinho, bloke!

beijos!

Nti Uirá disse...

paaai, gostei!

também fiquei com vontade de ver.

o texto está claro e dinâmico, decente!

beeijo